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23.11.08

O problema é de sustentabilidade, não é de formação

É elevada a taxa de repetência no 1º ano do ensino médio nas escolas do Rio de Janeiro segundo informações do INEP, repercutidas no jornal “O Globo Online” do dia 23 de novembro de 2008. Para a secretária de educação básica do MEC, Maria do Pilar, esta taxa se deve, entre outras coisas, ao período de “transformação pelo qual estão passando os alunos e ao modelo pedagógico das escolas”. Este modelo não está adequado aos jovens e é inviabilizador do diálogo com eles.
Outros professores, que participam da discussão, têm opiniões diferentes e que me parecem mais próximos do real. Um deles afirmou que a maior complexidade do ensino médio aparece como exigência de mais disposição para estudar e disciplina diante dos novos conteúdos. Para uma aluna a razão dos fracassos deve ser encontrada na metodologia de estudos: “a gente precisa estudar, mas nem sempre dá certo”.
As explicações mais psicologizadas parecem-me insuficientes para explicar o fenômeno; elas tendem a situar nas transformações psíquicas e biológicas dos estudantes de 14 e 15 anos as causas do problema, como se fossem fenômenos exclusivos destas idades. Também são grandes as dificuldades dos estudantes que entram na pré-adolescência.
Já as outras explicações – complexidade e metodologia de estudo – indicam-nos algumas pistas que facilitam a compreensão do fenômeno. Mas vejamos com mais detalhe uma e outra.
A idéia de que o ensino médio seja mais complexo que o ensino fundamental, por encerrar mais elementos, é verdadeira e compatível com a idade biopsíquica dos estudantes mais velhos e com uma escolaridade de nove anos já realizada. Supõe-se que a escolaridade básica proporcione os fundamentos indispensáveis a esta complexidade. Se porventura a capacidade para este entendimento deixa de existir, é na sua ausência ou na sua incompletude que devemos nos ater. Por que os alunos chegam sem esta base? Por que a preparação básica não está sendo adequada?
O entendimento de que a metodologia de estudo dos alunos de ensino fundamental não esteja compatível com as exigências do ensino médio é mais consistente e nos ajuda na compreensão do fenômeno. Senão vejamos.
Empiricamente começamos pela constatação de que os níveis de estudo pertencem a esferas administrativas diferentes; o ensino médio é da competência dos governos estaduais; e o fundamental encontra-se municipalizado já há algum tempo. Cada uma das esferas lhes dá o tratamento necessário conforme as constituições dos seus governos, com mais ou menos sustentabilidade em termos de recursos humanos, pedagógicos etc.
No âmbito do Estado do Rio de Janeiro se somente consideramos o tempo de permanência dos secretários de educação em suas pastas, começamos a adentrar na compreensão do fenômeno; o entra-e-sai de secretários implica em falta de continuidade de uma política séria de educação e no conseqüente não-engajamento do professorado. O impacto imediato não podia ser diferente: o estabelecimento do primado da anomia em todo sistema escolar. Face às divergências e ou conflitos entre as normas e determinações efêmeras, os professores e as escolas tendem às ações desarticuladas e descontínuas. O diálogo fica intransitivado numa mesma unidade escolar e entre as demais; é mais intransitivo ainda entre os dois níveis de educação: o Estado não dialoga com as Prefeituras e vice-versa. A natural seqüência que deve existir entre os níveis de escolaridade é, portanto, inexistente; em termos metodológicos, então, nem se fala! Em um a reprovação é um terror; noutro foi extirpada com a chamada “progressão continuada” que, na prática, transforma-se em aprovação automática.
O ensino fundamental, estruturado e posto em funcionamento pela Prefeitura do Rio de Janeiro, também vai mal das pernas mesmo que não evidencie o baixo desempenho dos seus alunos traduzido em número de reprovados. Em compensação, na mídia, é constante haver notícias de pais e mães reclamando que seus filhos terminam a escolaridade fundamental sem saber ler, escrever e fazer contas. Neste âmbito administrativo as secretárias têm mais tempo de permanência em suas pastas, mas isto não se exprime em continuidade de uma política para a melhoria da qualidade. Só em 2008, de abril a setembro, a Secretaria de Educação alterou radicalmente os procedimentos pedagógicos por meio de três resoluções. Os professores ficaram tontos sem saber o que fazer; os pais protestaram veementes e o sindicato dos professores precisou se mobilizar com alarde.

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