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6.9.12

O que é bom para a China é bom para o Brasil? Aliás é bom para quem?


Em artigo publicado na revista Carta Capital, edição de 05 de Setembro, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, nos dá uma importante lição em seu texto “Escola e cidadania”. Duas das suas contribuições são imediatas.  Primeiro marca bem as diferenças entre duas estirpes de economistas brasileiros. Em seguida coloca em evidência o que está sendo feito no campo da educação para a formação de nossas crianças e jovens, futuros cidadãos. Sua importância, contudo, não se restringe apenas a estas contribuições; leva-nos a refletir criticamente e a superar as nossas próprias inculcações alienantes.
Quanto aos economistas, são estas as diferenças existentes. Um grande grupo que pensa a educação como fator de “crescimento acelerado da produtividade da mão de obra, aquisição de vantagens comparativas dinâmicas e melhor distribuição de renda” e não se cansa de exaltar os resultados obtidos pelo Japão, Coreia, Taiwan e China. Os seus componentes, porém, omitem as condições em que são obtidos tais resultados. Deixam, por exemplo, de trazer à luz as taxas de suicídio entre estudantes japoneses e coreanos, as condições de oferta de ensino e os sacrifícios que as famílias destes países se impõem para que os seus filhos honrem as suas tradições familiares. Há diversas famílias na China e no Japão que gastam as suas economias com aulas de apoio, cursos extras e etc. para que não seus filhos não sejam excluídos do sistema escolar.
À propósito hoje, o jornal O Globo em sua edição online (6/9/2012) estampou as condições de oferta de ensino na China com duas fotos produzidas pelo jornal The Sun. As imagens são estarrecedoras e além de valer por mil palavras, revelam os “sentimentos humanitários” dos economistas deste primeiro grupo.
Um porta-voz desta escola chinesa, extremamente ideologizado por economistas desta mesma estirpe, diz que as crianças não têm tempo de irem para casa e que falta espaço para um local adequado de repouso. Com uma grande dose de cinismo afirma que “estão perfeitamente confortáveis” e que “não tem como se atrasarem para a aula seguinte”.
Infelizmente entre os nossos policies makers da área educacional, parece predominar os economistas deste tipo de humanitarismo. Aqueles que não se importam com condições de oferta de ensino semelhantes às da China para as nossas crianças e jovens, desde que futuramente se tornem mão de obra mais produtiva, produzam ganhos comparativos e contribuam para melhorar a distribuição de renda. Eles são os que somente pensam nos fins e pouco se importam com os meios.
O outro grupo de economistas é de outra cepa, bem diferente, e é uma pena que esteja fora da condução dos rumos de nosso sistema educacional, de todas as suas modalidades e níveis. Para estes economistas, entre os quais Belluzzo se inscreve, a educação das nossas crianças e jovens deve se situar no patamar iluminista-republicano, no qual tem grande importância para a formação da cidadania, autonomia e capacidade de compreensão do indivíduo como “titular de direitos e fonte do poder republicano”. Outro modo de compreender a educação e os seus valores resultaria em completo abastardamento.
Na aula que nos dá em seu artigo, Belluzzo ainda nos demonstra também que a educação, sem negar-lhe a importância na qualificação técnica da mão de obra, como propulsora de emprego e distribuição de renda somente é capaz de oferecer sua contribuição num contexto de prosperidade. Quando há processos de desindustrialização, reestruturação de empresas gerando desemprego estrutural, crise fiscal e ineficiência dos gastos públicos, a educação pouco tem a oferecer, ela “naufraga como força propulsora do emprego e da distribuição de renda”. Os exemplos práticos que evoca são indiscutíveis. De nada vale ser “empregável”, isto é ter currículo e perfil para dado posto de trabalho,  numa situação de crise econômica como a que vivem a Europa e os Estados Unidos quando se liquidam e informatizam postos de trabalho. Em outras palavras, não é a educação que gera empregos, mas sim o desenvolvimento econômico. Na Inglaterra do século XVIII, foi a Revolução Industrial que demandou a criação do sistema escolar para oferecer a educação que a burguesia tinha necessidade. O Milagre Japonês, do período pós-Segunda Guerra, com muito investimento americano, pode ser outro exemplo: ele ao mesmo tempo compreende a reforma educacional e a rápida industrialização do país, cabendo à educação atender às demandas mais imediatas da economia em acelerado desenvolvimento.  
Belluzzo responsabiliza a educação com matrizes oriundas Teoria do Capital Humano e da doutrina neoliberal pela formação de “um exército de subjetividades mutiladas, qualificadas sim, mas incapazes de compreender o mundo em que vivem”. É uma educação referenciada a competências e habilidades pauta pela razão técnica imediata que se presta eficientemente para “a pauperização das mentalidades e o massacre da capacidade crítica”. Também culpa a mídia pela “automação psíquica” dos indivíduos, que os tornam seres de “reações imediatas, simplificadoras e simplistas”, incapazes de superar o falso conflito entre o bem e o mal e as diversas formas de manipulação. Com igual ênfase termina seu artigo denunciando o atual massacre educacional e midiático às formas de pensar, contestar e desenvolver a razão crítica.  Para ele, está em curso a produção de indivíduos mutilados, homens massa, tipos ideais para as formas de exploração que o capitalismo exige hoje em dia  unicamente para a sua própria realização.
O artigo “Escola e cidadania” é, portanto, imperdível para todos aqueles que estão na luta por uma educação pública, gratuita, laica, garantida e financiada pelo Estado, e de qualidade referenciada socialmente. E não basta apenas lê-lo. É imprescindível a sua maior divulgação.

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