(Entrevista concedida à jornalista Alessandra Bisoni, do Jornal Folha Dirigida. Publicada na Capa do Caderno Educação, edição de 06.07.2010).
Folha Dirigida - O Sr. considera que a associação entre universidades e empresas é realmente benéfica para o incentivo à pesquisa nas universidades ou beneficia só as empresas que usufruem dos resultados?
A associação entre universidades e empresas deve ser vista no contexto das teses que as criticam como improdutivas e incapazes de alçar o País ao nível dos países mais desenvolvidos e centrais do mundo globalizado. No fundo o que se pretende é que as universidades se submetam às regras de competição do mercado e, de preferência, transfiram parte considerável de suas atividades fins – ensino, pesquisa e extensão – a uma nova burguesia de serviços, de modo conveniente aos interesses dela.
Folha Dirigida - Deve ser papel de uma agência de fomento à pesquisa incentivar este tipo de associação entre universidades e empresas? Ou o formado mais adequado seria o de financiar o trabalho nas universidades?
Penso que não. A educação superior, para além de sua função de contribuir para a melhoria do conjunto da sociedade, é um bem público com funções de educar, formar e realizar investigações de relevância para a sociedade como um todo; promover o saber mediante a investigação nos âmbitos da ciência, arte e humanidade; fomentar métodos educativos inovadores baseados no pensamento crítico e na criatividade. Seu financiamento por agências de fomento à pesquisa, tais como a FAPERJ e o CNPq, ética e politicamente, preserva a educação superior como uma prioridade social, sem que se submeta aos imperativos do empresariado capitalista, capaz de transformar a educação superior em um bem privado.
Folha Dirigida - A presença do investimento externo à universidade ou aos governos mantenedores tira a liberdade da pesquisa?
Sim, especialmente se o investimento externo estiver comprometido com a lucratividade, isto é, com a acumulação de riquezas. O mundo empresarial sempre trabalha com a relação custo-benefício, com a imediatidade de transformar tudo em meio de enriquecimento. Duvido que os investimentos provenientes de empresas privadas admitiriam investigações caras e demoradas em áreas do conhecimento que deixem de proporcionar ganhos imediatos. O corolário da intervenção externa, no que diz respeito ao financiamento das pesquisas, seria, imediatamente, determinar o que têm relevância econômica e capacidade de sobrepor-se à concorrência. A liberdade de pesquisa, nestes termos, fica condicionada para o que aponta para a lucratividade, acumulação, enriquecimento...
Folha Dirigida - Que tipo de consequências poderia trazer um incentivo maior à parceria entre universidades e empresas, principalmente estimuladas por órgãos governamentais? Poderia, por exemplo, desestimular os projetos nas áreas menos rentáveis, como as ciências sociais?
Na questão anterior já afirmo ser possível desestimular os projetos em áreas menos rentáveis. O metabolismo do capital não admite pesquisas de caráter social. Seu interesse está integralmente voltado para o mercado. Ele tende a privatizar todas as pesquisas importantes para a sociedade, como por exemplo as pesquisas com células-tronco, energia, produção de alimentos etc., transformando seus resultados em mercadorias vendáveis por preços vultosos, inacessíveis para a maioria da população.
Folha Dirigida - Na sua avaliação, as universidades têm dado a contribuição que deveriam com a produção científica no país? O que fazer para melhorar?
Claro que sim. O Brasil hoje aparece muito bem no cenário mundial, colocando-se em 13º lugar entre os países que mais produzem cientificamente, superando, por exemplo, a Rússia e a Holanda. As críticas que visam desqualificar as universidades, nossos maiores centros de investigação e de produção científica, pretendem que elas somente se comprometam com a produção de novos conhecimentos científicos como força produtiva. Há diversos intelectuais da fração da burguesia interessada na produção científica como força produtiva que, inclusive, advogam níveis de comprometimento das universidades com uma economia pautada pelo conhecimento, aceitando haver uma ingerência “controlada” das empresas nas atividades fins das universidades. Sou, porém, de opinião contrária sem pretender me situar numa posição de absoluta resistência. Penso que para melhorá-las ainda mais é preciso que sejam mais potenciadas conforme as necessidades humanas, evitando-se democraticamente que fiquem à mercê dos homens de negócio avidamente interessados em submetê-las à esfera privada e à lógica de exclusão.
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