A crença e a adoração da
maioria dos economistas e dos responsáveis pela elaboração das políticas
públicas no deus mercado, segundo as quais ele seria o grande regulador das
transações financeiras, estão dando com os burros n’água depois de permitir que
os grandes grupos financeiros e os grandes bancos de investimentos fincassem os
seus tentáculos sobre a economia mundial. A crise estrutural do capital em
bases neoliberais está em curso com mais visibilidade desde 2008 e vem se
agravando, tal qual um tsunami que ameaça a vida planetária e fixa no horizonte
dos cidadãos comuns e das sociedades o desemprego, a precariedade, a desigualdade
e a perda da soberania popular. Já se fala até num precariado mundial.
A crise, em sua essência,
não deriva de incapacidade político-administrativa nacional mas do esgotamento
da rentabilidade máxima das aplicações financeiras que mercadorizou a produção
de bens e serviços de base, a educação, saúde, cultura, recursos naturais e o
conjunto dos seres vivos. Ela cresce a cada dia, assusta e impõe urgentes
medidas com ênfases nos aspectos regulatórios, com a finalidade de reduzir a
probabilidade de seu agravamento e de melhorar a capacidade gerencial de suas
manifestações. Na sua contramão muitas manifestações populares já estão
ganhando as ruas no Chile, Argentina, Itália, França, Espanha, Inglaterra e
Estados Unidos.
Sobre a expansão da
rentabilidade financeira no campo educacional, no entanto, pouco ou nada tem
sido falado. Mas ela vem subsumindo com força e rapidez a oferta educacional às
leis de competitividade do mercado. Os rankings dos cursos e dos desempenhos
dos estudantes têm servido para orientar não apenas as matrículas daqueles que
buscam as “melhores” instituições de ensino, mas também aonde o investidor deve
aplicar e maximizar os seus ganhos. Pouco importa que a educação seja um bem
público, um direito historicamente conquistado que compreende qualidade,
gratuidade e universalidade.
A privatização da educação
brasileira está ocorrendo em processo acelerado e se torna maior ainda com a
internacionalização de ações das empresas na medida em que predomina a
liberdade de investimentos em um enorme espaço aberto a novos e lucrativos
investimentos na educação presencial e a distância. Praticamente não há
restrições constitucionais à participação da iniciativa privada nacional e
estrangeira na educação e no ensino das nossas crianças, jovens e adultos.
Apenas se exige que as empresas cumpram as normas gerais da educação nacional e
sejam autorizadas pelo Poder Público. Assim, não por acaso o Brasil fascina os
homens de negócio daqui e do exterior. O Brasil é o sexto maior mercado
educacional mundial. Tem matriculados cerca de 58 milhões de alunos na educação
básica e a iniciativa privada somente atende 14 % desse total; no ensino
superior as matriculas ultrapassam a casa dos 5 milhões, mas apenas cobrem 14%
da população com idade entre 18 e 24 anos. Um estudo do Observatório
Universitário do instituto Databrasil – Ensino e Pesquisa para 2010 estima que
77,2% das matriculas sejam oferecidas por instituições privadas de ensino
superior, o que corresponde ao atendimento de 4.775.420 de estudantes (Carvalho,
2004)[1]
Uma empresa educacional,
com sede em Belo Horizonte-MG, pode ser tomada como exemplo de expansão da
lógica da rentabilidade máxima das aplicações financeiras no campo educacional
brasileiro. Ela atualmente está presente em 30 municípios de 9 estados
brasileiros, nos quais controla 40 unidades de ensino superior, com mais de 92
mil alunos, e mais de 700 escolas de educação básica com cerca de 280 mil
alunos. Em 4 municípios esta empresa atua integralmente no oferecimento da
educação básica. Somente no primeiro semestre de 2011 obteve um lucro líquido
de 174%. Em 2006 sua renda liquida chegou a 113 milhões de
reais. Sua avidez de expansão não para e se faz acompanhar de oferta de ações
na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA) e também junto a investidores
institucionais residentes e domiciliados nos Estados Unidos da América, por
meio de Agentes de Colocação Internacional (Itau BBA USA Securities Inc., BTG
Pactual US Capital Corp., Santander Investment Securities Inc., Bradesco
Securities, Inc. e Banco Votorantim Securities, Inc.)[2].
Outra grande empresa
educacional, com sede em São Paulo, lidera o segmento privado de Educação
Básica no país, vendendo diretamente o seu sistema de ensino a 535 mil alunos
(livro didático, cd-roms etc). As suas escolas conveniadas, mais de 2400 no
Brasil e no exterior, adquirem também completo suporte pedagógico e programas
de relacionamento com a comunidade escolar, incluindo campanhas institucionais
e de marketing. Em seu site institucional, afirma atender a um total de 10
milhões de alunos no Brasil, Japão e Estados Unidos[3].
Outras empresas com rendas
líquidas superiores a 100 milhões de reais em 2006, também se destacam capturadas
pela lei do máximo valor: Estácio Participações (829 milhões), Sistema
Educacional Brasileiro/Pearson Sistemas do Brasil S.A. (120,4
milhões), Anhanguera Educacional (113 milhões)[4]
Ora, se somente consideramos
essas empresas de educação, e incluímos entre elas a Abril Educacional que
controla as editoras Ática e Scipione, é possível, por um lado, ter uma
dimensão da pressão política que podem exercer junto a vereadores, deputados e
senadores, MEC e Conselho Nacional de Educação para desregular o campo da
educação nacional e abocanhar vultosas somas das verbas públicas. Por outro nos
permite associar a elas o empenho do Movimento Todos pela Educação de ser o
principal protagonista no debate sobre a educação nacional, na construção de
uma agenda, afirmação de um novo pacto social por políticas públicas, definição
judicial do que é qualidade da educação etc. A associação de ambos, empresários
movidos pela alta rentabilidade e empresários do Movimento Todos pela Educação,
cria uma frente privatista que definitivamente entroniza o deus mercado no
campo da educação tendo apenas como expectativa os quatro pilares da educação: aprender
a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.
Esse deus, porém, é de
barro e suas representações estão prestes a ruir definitivamente. A indignação
social mundial materializado no movimento dos indignados, que se levanta contra
ele e seus acólitos, deveria na sua versão brasileira abrigar a imediata
exigência de proteção da educação pública como direito social garantido pelo
Estado e efetivo controle de capitais no campo da educação. A grande lição que a
crise do capitalismo nos oferece é que as suas estruturas neoliberais foram
somente construídas para a rentabilidade máxima. Jamais esteve em seus
horizontes produzir um legado educacional sólido capaz de elevar as novas
gerações a patamares de uma sociabilidade mais justos, iguais, fraternos e de
promoção de nossa própria humanidade.
[1]
CARVALHO, Márcia Marques de. Projeção da
Matrícula no Ensino Superior no Brasil, por Dependência Administrativa:Um
Exercício Preliminar. Rio de Janeiro: Observatório Universitário/ Instituto
Databrasil – Ensino e Pesquisa, 2004. Disponível no site: http://www.observatoriouniversitario.org.br/pdf_documentos_de_trabalho/documentos_de_trabalho_26.pdf
[2]
Dados obtidos no site institucional da Kronton Educacional. Disponível: http://www.kroton.com.br/ Acesso em
Outubro de 2011.
[3]
Site institucional do Grupo Positivo. http://www.positivo.com.br
[4]
Informações obtidas no site institucional da BOVESPA. Disponível: http://www.bmfbovespa.com.br/cias-listadas
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