Tenho por hipótese
que os fascistas de qualquer idade nascem de uma existência individual espiritualmente
pobre, pouco importando se têm ou não alta escolaridade, pautada por
experiências próprias que formam os seus juízos de valor. Um fascista não faz
mediações tendo como objeto a realidade, quando muito faz meditações
como se fosse um monge, descoladas da realidade concreta e que acabam por
produzir uma outra realidade que não é verdadeira, é mistificada.
Eles podem ter
cursos de mestrado e doutorado, terem estudado nas melhores universidades, e
não superarem a categoria de homens-massa. São homens e mulheres que não atuam
por si mesmos; são dirigidos, influenciados e, com frequência, membros de clubes
de serviços e organizações similares.
Regra geral se dizem neutros e indiferentes à política e a
todas as questões sociais, a despeito de serem mulheres e homens, jovens e
velhos. É comum à maioria a grande dificuldade de refutar argumentos bem elaborados
porque nunca se envolvem em embates de ideias. Com facilidade aceitam como
verdade o que lhes é dito pelo noticiário da TV, jornais e revistas
informativas. Tendem a ser pródigos em clamores pelo controle militar da ordem
social dadas as suas dificuldade de compreender a complexidade e a liberdade dos
regimes democráticos.
Os fascistas desde
que nascem veem a pobreza e até se condoem com ela, mas a atribuem aos indivíduos,
tidos por eles como preguiçosos e indolentes, sem se darem conta dos processos
históricos que promovem a concentração de riquezas nas mãos de poucos. Em
termos educacionais lhes é fácil dizer que a educação brasileira é péssima,
mesmo que sequer saibam definir o que é uma educação de qualidade. Eles são
rápidos em críticas e condenações ao sistema escolar e não se importam com as
causas estruturais que lhes dão origem; poucos sabem que a maioria das escolas
de ensino infantil e fundamental é da competência de municípios pobres; que 75%
destes apenas contribuem economicamente com 0,6% para a composição do PIB; que
25% dos municípios contribuem com 0,1%; e que a maioria está sob o cabresto
curto de políticos repassadores de emendas parlamentares, já que vivem sem
verbas próprias para o oferecimento de serviços públicos de qualidade.
Os fascistas têm propensão de nascer em sociedades mais despolitizadas,
nas quais as razões tendem a desaparecer e a ceder espaço ao domínio da irracionalidade
– atualmente difundida e valorizada pelos intelectuais da pós-modernidade que
insistem no extermínio dos tribunais da filosofia, história, sociologia, ética
etc. como é o caso, por exemplo, do filósofo pós-moderno Richard Rorty. Nessa mesma
sociedade, as famílias, os partidos e associações de classe, a mídia e as
igrejas, o direito, os quarteis e demais agentes soem se eximir de suas
responsabilidades educacionais, transferindo ao aparelho escolar a
exclusividade de educar e instruir, como se estivessem plenos de capacidade
para tal tarefa e recebessem financiamentos suficientes.
Os fascistas, sem nunca fazer as suas próprias mediações, se
deixam cativar pelos seus pontos de vista externos e estéticos. Pouco lhes
importam se tal ordem é autoritária, repressiva e classista; como eles conseguem
viver o seu dia a dia submerso na própria alienação, teimam em advogar sempre a
sua continuidade. Pouco se importam com a qualidade e a abrangência democrática
dos regimes políticos, porque são incapazes de ter os seus próprios argumentos
racionais; eles acompanham o que os seus amigos pensam; eles são
maria-vai-com-as-outras. Com facilidade se tornam anticomunistas, homofóbicos,
xenofóbicos etc. porque alguém lhes disse que os comunistas são perigosos, que
os gays são degenerados e os imigrantes lhes tomam os postos de trabalho; só
mudam de julgamento se seus influenciadores mudarem de opinião.
Os fascistas nascem e se multiplicam, portanto, em ambientes sociais
e familiares onde os bons livros e autores, a boa música e seus compositores, as
consagradas peças de teatro e os grandes dramaturgos, a política e a história foram
destituídas dos seus lugares ou simplesmente queimados em praça pública, na
Alemanha nazista, em 1933.
Por estas razões não constitui
surpresa que os indivíduos fascistas possam nascer até dentro das nossas
próprias casas e ser nossos parentes e amigos mais próximos. Basta que o
ambiente se caracterize pela pobreza de espírito.
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