Abertura de novela da TV Globo
Estamos ficando mais pobres. Esta foi a manchete de diversos veículos de imprensa, em janeiro de 2019, tão logo houve a posse do governo bolsonarista: o PIB per capita e consumo das famílias caiu, o rendimento médio da população diminuiu, o número de pobres e extremamente pobres aumentou e a desigualdade parou de cair. Se você pensou que tais indicadores melhoraram após quase dois anos de Bolsonaro no Palácio do Planalto e de Paulo Guedes à frente do Ministério da Economia, enganou-se redondamente. Se somamos a este quadro deplorável o que acontece na educação nacional a situação é catastrófica. Tomando as metas traçadas pelo Plano Nacional de Educação 2014-2024 como referência, o MEC voltou as costas para elas de 2019 para cá. Os três ministros indicados e nomeados pelo ex-Capitão têm demostrado que nada entendem de educação e que, uma vez empossados, esmeram-se em realizar a missão quixotesca de combater o “marxismo cultural”, a “balburdia” e o “ensino de sexo sem limites nas universidades”.
A pergunta que não quer se calar é esta: há alguma ação
concreta sendo realizada para a melhoria da educação nacional desde janeiro de
2019, quando o governo atual tomou posse?
A realidade mostra que as ações ocorrem em sentido contrário
à melhoria necessária. A mídia tradicional tem estado atenta ao flagelo
educacional que tende a se ampliar. Em 15 de julho de 2019, o jornal Folha de São
Paulo, divulgou que o contingenciamento de R$ 5,8 bilhões de verbas destinadas às
universidades públicas e programas de fomento à pesquisa não foi investido na
educação básica e que o governo ainda “esvaziou” programas relativos à educação
de tempo integral, novas creches, alfabetização e ensino técnico. O mesmo
diário noticiou que o Programa Dinheiro Direto nas Escolas (PDDE), que deveria
estimular o ensino integral ficou sem repasses de recursos federais neste mesmo
ano, comprometendo a realização da Meta 6 do Plano Nacional de Educação
2014 – 2024: “oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das
escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos(as) alunos(as) da
educação básica” (INEP, 2020)[1]. O
fato é que o
Plano Nacional de Educação 2014-2024 em nada avançou após o golpe que destituiu
a Presidente Dilma Rousseff, eleita democraticamente com mais de 54
milhões de votos; está em modo marcha-a-ré no atual governo.
No Relatório do 3º Ciclo de Monitoramento das Metas do
PNE, publicado recentemente pelo INEP - Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, fica claro que apenas duas das vinte
metas foram atingidas até o presente, as metas 9 e 13. Todavia, ambas foram
cumpridas de um ponto de vista quantitativo. É verdade que a taxa de
alfabetização da população de 15 anos ou mais foi reduzida, de 6,8%, em 2018,
para 6,6% em 2019; ainda temos 11 milhões de analfabetos. Mas, só diminuir as
taxas não é suficiente. É indispensável que alfabetização de mais 200 mil
pessoas tenha lhes possibilitado a capacidade de “compreender, usar, refletir
sobre e envolver-se com os textos escritos, a fim de alcançar um objetivo,
desenvolver seu conhecimento e seu potencial de participar da sociedade”; formular,
empregar, interpretar e utilizar conceitos, procedimentos, e ferramentas matemáticas
em descrições, explicações e previsões de fenômenos; e adquirir competências
para se envolver com questões científicas e com a ideia de ciência. (INEP,
2018)[2].
Para dar conta da problemática questão de alfabetização de
jovens de 15 anos ou mais, o MEC nada fez ou está fazendo, as suas únicas ações
em curso estão voltadas para a educação de crianças em idade correta de
alfabetização, mesmo assim ineficazes para produzir o efeito pretendido: o “Programa
Tempo de Aprender”, que presta apoio à alfabetização, aprimora as avaliações da
alfabetização e objetiva valorizar os profissionais de avaliação; e o “Programa
Conta Pra Mim”, que fornece às famílias uma série de vídeos dedicados à literacia
familiar, isto é, ao maior engajamento de familiares com a leitura para bebês e
crianças.
Também é verdade que a Meta 13 foi cumprida em termos de
ampliação da quantidade de mestres e doutores nos quadros docentes do sistema
de educação superior: 75% de mestres e 35% de doutores. O cumprimento desta
meta também precisa ser questionado, perguntando-se qual o percentual de
mestres e doutores oriundos de Programas de Pós-graduação Stricto Senso
avaliados pela CAPES com notas entre 5 e 7?
Dos 3.365 cursos de Mestrado/Doutorado Acadêmicos nomeados
pela CAPES no Relatório Quadrienal 2017, apenas 1.095, 32%, são avaliados com
notas 5, 6 e 7. Os demais 2.270, 68%, tão-somente conseguem notas entre 1 e 4. Os
mestrados e doutorados com notas 6 e 7 são considerados de excelência
internacional. Aqueles com notas 4 e 5 se encontram em processos de ajuste
acadêmico e de produtividade. Os mestrados e doutorados com notas entre 1 e 3 são
recentes e ainda em fase de aperfeiçoamento e consolidação, e sua produção
científica é incipiente. Os Mestrados Profissionais avaliados em 2017 somam 703
cursos distribuídos pelo território brasileiro. Somente 49 – 6,9% - obtiveram a
nota 5, máxima; 215 – 30,6%, a nota 4; 398 - 56,8%, a nota 3; 35 – 4,9%, a nota
2; e 6 – 0,8% - a nota 1.
À exceção das duas metas do PNE 2014-2024 já atingidas,
todas as demais estão longe de serem acertadas e, tudo indica, que não o serão,
nomeadamente neste governo. E é urgente que sejam. Cerca de 1,5 milhão de
crianças de 0 a 3 anos estão sem creches e mais ou menos 330 mil crianças de 4
e 5 anos, sem pré-escola. 26,9% de jovens de 15 a 17 anos estão fora das
escolas de ensino médio. O percentual de matrículas em atendimento
especializado está em queda. O oferecimento de educação em tempo integral está
distante de atender a pelo menos 25% de estudantes da educação básica. O IDEB –
Indicador de Desenvolvimento da Educação Básica – do ensino fundamental se
encontra estagnado desde 2013 e o do ensino médio está abaixo dos resultados
obtidos em 2009 e 2011. A escolaridade da população rural e de negros e não
negros revela taxas relativamente lentas de crescimento. O percentual de
matrículas da Educação de Jovens e Adultos está significativamente distante da
meta estabelecida para 2024; o mesmo ocorre com as matrículas em educação
profissional técnica de nível médio: seu crescimento foi de apenas 17% no
período entre 2013 e 2019. As taxas de matrículas na educação superior precisam
crescer 12,6 p.p ao ano até 2024 para concretização da Meta 12; as matrículas
em cursos de mestrado e doutorado precisam atingir o patamar de 60 mil mestres
e 25 mil doutores. O percentual de docentes com formação superior tem crescido,
mas ainda há 45,2% professores de educação infantil sem esta formação; 33,9%, com
titulação inadequada nos anos iniciais do ensino fundamental; 46,8% nos anos
finais do ensino fundamental; e 36,7% no ensino médio. Em 2019, somente 37,9%
dos docentes na educação básica possuíam o nível de especialização, 2,8%
mestrado e 0,6% doutorado. Os profissionais do magistério das redes públicas de
educação ainda não têm os seus rendimentos médios equiparados a outros
profissionais com a mesma escolaridade e em algumas unidades da Federação
sequer dispõem de planos de carreira. O movimento de efetivação da gestão
democrática da educação, com este governo está de volta ao passado tantas as
interferências autoritárias, em particular no âmbito das universidades
públicas, caracterizadas pelas indicações de reitores contrárias à consulta
pública à comunidade escolar. Por fim, last but not least, a questão do
financiamento da educação: o governo ameaça suspender o FUNDEB, Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais
de Educação, de 2020 a 2022, e ainda pressiona para que a complementação
adicional e obrigatória da União, 10%, cerca de R$ 16 bilhões, seja repartida com o programa Renda Brasil,
que deverá substituir o Bolsa Família.
Como se vê, a gestão bolsonarista do MEC e do país flagela a
educação nacional e a faz retroceder a um passado remoto e ultrapassado. É
típico do reacionarismo se manter preso ao passado. A atualidade lhes preocupa
ou causa repugna. Eles veem a sociabilidade existente como problemática e
procuram desconstruí-la. Eles são arrogantes e gostam do poder.
[1]
BRASIL. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA.
Relatório do 3º ciclo de monitoramento das metas do Plano Nacional de
Educação – 2020 [recurso eletrônico]. – Brasília: Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020
[2]
BRASIL. INEP. Relatório Brasil no PISA 2018 - versão preliminar [recurso
eletrônico]. – Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira, 2018.
5 comentários:
Esperemos que chegue logo ao fim.
Obrigado pelo comentário.
Mas não basta esperar, é preciso agir. E como? Em candidatos que se comprometam com a educação de qualidade referenciada socialmente. No discurso todos se comprometem, mas precisamos distinguir aqueles que são a favor da educação pública qualidade. Muitos representam o empresariado e falam em nome deles. A derrubada do bolsonarismo já ajudará bastante
Texto super pertinente para o atual mo sombrio que estamos vivendo na educação.
Acredito que uma das principais razões para quem escolhe se graduar em licenciatura, é a diferença que a pessoa quer fazer na vida das pessoas. Por isso é triste, saber que mesmo com boa vontade e dedicação, nós dependemos de políticas públicas em educação para exercer nossos plenos domínios. Por causa disso, estou me capacitando para ressignificar a minha carreira. Pois, acredito que a melhor forma de lutar, nessa situação que vivemos é a : persistência e qualificação.
Oi Camila, é isto: queremos fazer diferença. Saber das coisas por piores que sejam é melhor do que não saber. Quem sabe faz a hora... não se deixa levar pela conversa dos outros. Concordo contigo: persistir e qualificar é o que importa, mas precisamos saber as direções das nossas lutas.
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