Ontem publiquei um post na minha página de Facebook acerca do livro Cazuza, de Viriato Correia, um livro que li lá pelos meus doze, treze anos de idade. A sua recepção pelos meus amigos de bolha foi muito boa, até diria que excelente.
Para quem não leu livro, ele conta a história de um garoto do interior do Maranhão e das suas passagens pelas escolas do lugarejo onde morava, da vila - um pouco maior - e de São Luís. Nem preciso que gostei demais da conta. Aliás, tive o mesmo prazer ao ler o Ateneu, de Raul Pompeia. As histórias de crianças em ambientes escolares são sempre cativantes, pena que existem em pequeno número no meio editorial brasileiro.
À época da leitura era impossível que eu percebesse a crítica àquela escola autoritária na qual pontificava a pedagogia bancária como o Paulo Freire a nomeou. Viriato Correia, de fato, carrega nas tintas ao discorrer sobre a primeira escola de Cazuza e o modo como o professor João Ricardo conduzia sob tacão a sua classe multisseriada de crianças de sete aos dez anos de idade. Aquela escola funcionava em dois turnos: pela manhã a frequentavam as crianças de seis e sete anos; à tarde, os que eram mais idosos, isto é aqueles com nove nove e dez anos. No meio rural as escolas multisseriadas eram muito comuns, por várias razões, destacando-se de imediato o déficit de professores. Professores com formação de nível superior eram coisas raras. Nestas escolas multisseriadas os docentes raramente tinham formação compatível com o ensino médio de hoje. Eu mesmo estudei em uma escola destas no lugarejo onde nasci (Martins Soares, MG). O prédio onde a Escola Primária funcionava era muito simples: de um lado uma grande sala cheia de carteiras duplas com pés-de-ferro, do outro lado a casa em que morava a família da diretora, D. Alzira Miranda, esposa de Seu Quito. No meio havia um pátio coberto com a mesma área dos dois cômodos.
Mas, voltemos ao livro...
Cazuza logo percebeu que a escola estava longe de ser o lugar de alegria que imaginara. Já no primeiro dia de aula viu como a palmatória podia ser muito doída. Os bolos em várias mãos dos seus colegas podiam mostrar o tamanho da dor pelo inchaço provocado.
Do meu ponto de vista Joao Ricardo não era um professor, mais parecia um capitão-do-mato de relho na mão submetendo a petizada, quebrantando as suas vontades, extroversões e amor-próprio. Educava para a submissão, para obedecer. A utilização constante da palmatória em crianças pequenas servia para controlar e neutralizar a criancice, modificar o ser criança. Não era uma prática muito diferente dos torturadores da ditadura civil-militar que acometeu o nosso país durante vinte e anos - 1964-1985. também estes gorilas tinham o objetivo de quebrantara resistência dos seus prisioneiros.
Aqui no Brasil, juntamente com as críticas à ditadura, foram inúmeras as críticas a este tipo de escola e pedagogia. Paulo Freire, entre todos, foi o mais proeminente em seu famoso livro Pedagogia do Oprimido. Ele tinha razão, era uma educação com métodos para oprimir, manter uma população inteira segura pelos beiços pela aristocracia brasileira. Fora do Brasil também inúmeras obras devastaram esta pedagogia a começar por Pierre Bourdieu (A Reprodução). Diversos cientistas da educação examinaram a escola e sua pedagogia virando os seus corpos do avesso. Como diria Lenin, curvou-se a vara envergada para o outro lado. Contudo, eu diria, a vara ainda continua empenada porquanto a inversão de sua curvatura criou uma escola incapaz de suprir os estudantes de competências necessárias para enfrentar os desafios que a vida lhes oferecem. As propostas de uma escola democrática, universal, gratuita e de qualidade socialmente referenciada estão em discussão. No presente as políticas educacionais atendem mais aos interesses dos poderosos empregadores, em particular na produção de uma farta oferta de mão-de-obra barata, capaz de viver em profunda alienação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário