9.11.11

Professores estão excluídos do debate público sobre política educacional


O deus mercado e a privatização da educação brasileira


 A crença e a adoração da maioria dos economistas e dos responsáveis pela elaboração das políticas públicas no deus mercado, segundo as quais ele seria o grande regulador das transações financeiras, estão dando com os burros n’água depois de permitir que os grandes grupos financeiros e os grandes bancos de investimentos fincassem os seus tentáculos sobre a economia mundial. A crise estrutural do capital em bases neoliberais está em curso com mais visibilidade desde 2008 e vem se agravando, tal qual um tsunami que ameaça a vida planetária e fixa no horizonte dos cidadãos comuns e das sociedades o desemprego, a precariedade, a desigualdade e a perda da soberania popular. Já se fala até num precariado mundial.
A crise, em sua essência, não deriva de incapacidade político-administrativa nacional mas do esgotamento da rentabilidade máxima das aplicações financeiras que mercadorizou a produção de bens e serviços de base, a educação, saúde, cultura, recursos naturais e o conjunto dos seres vivos. Ela cresce a cada dia, assusta e impõe urgentes medidas com ênfases nos aspectos regulatórios, com a finalidade de reduzir a probabilidade de seu agravamento e de melhorar a capacidade gerencial de suas manifestações. Na sua contramão muitas manifestações populares já estão ganhando as ruas no Chile, Argentina, Itália, França, Espanha, Inglaterra e Estados Unidos.
Sobre a expansão da rentabilidade financeira no campo educacional, no entanto, pouco ou nada tem sido falado. Mas ela vem subsumindo com força e rapidez a oferta educacional às leis de competitividade do mercado. Os rankings dos cursos e dos desempenhos dos estudantes têm servido para orientar não apenas as matrículas daqueles que buscam as “melhores” instituições de ensino, mas também aonde o investidor deve aplicar e maximizar os seus ganhos. Pouco importa que a educação seja um bem público, um direito historicamente conquistado que compreende qualidade, gratuidade e universalidade.
A privatização da educação brasileira está ocorrendo em processo acelerado e se torna maior ainda com a internacionalização de ações das empresas na medida em que predomina a liberdade de investimentos em um enorme espaço aberto a novos e lucrativos investimentos na educação presencial e a distância. Praticamente não há restrições constitucionais à participação da iniciativa privada nacional e estrangeira na educação e no ensino das nossas crianças, jovens e adultos. Apenas se exige que as empresas cumpram as normas gerais da educação nacional e sejam autorizadas pelo Poder Público. Assim, não por acaso o Brasil fascina os homens de negócio daqui e do exterior. O Brasil é o sexto maior mercado educacional mundial. Tem matriculados cerca de 58 milhões de alunos na educação básica e a iniciativa privada somente atende 14 % desse total; no ensino superior as matriculas ultrapassam a casa dos 5 milhões, mas apenas cobrem 14% da população com idade entre 18 e 24 anos. Um estudo do Observatório Universitário do instituto Databrasil – Ensino e Pesquisa para 2010 estima que 77,2% das matriculas sejam oferecidas por instituições privadas de ensino superior, o que corresponde ao atendimento de 4.775.420 de estudantes (Carvalho, 2004)[1]
Uma empresa educacional, com sede em Belo Horizonte-MG, pode ser tomada como exemplo de expansão da lógica da rentabilidade máxima das aplicações financeiras no campo educacional brasileiro. Ela atualmente está presente em 30 municípios de 9 estados brasileiros, nos quais controla 40 unidades de ensino superior, com mais de 92 mil alunos, e mais de 700 escolas de educação básica com cerca de 280 mil alunos. Em 4 municípios esta empresa atua integralmente no oferecimento da educação básica. Somente no primeiro semestre de 2011 obteve um lucro líquido de 174%. Em 2006 sua renda liquida chegou a 113 milhões de reais. Sua avidez de expansão não para e se faz acompanhar de oferta de ações na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA) e também junto a investidores institucionais residentes e domiciliados nos Estados Unidos da América, por meio de Agentes de Colocação Internacional (Itau BBA USA Securities Inc., BTG Pactual US Capital Corp., Santander Investment Securities Inc., Bradesco Securities, Inc. e Banco Votorantim Securities, Inc.)[2].
Outra grande empresa educacional, com sede em São Paulo, lidera o segmento privado de Educação Básica no país, vendendo diretamente o seu sistema de ensino a 535 mil alunos (livro didático, cd-roms etc). As suas escolas conveniadas, mais de 2400 no Brasil e no exterior, adquirem também completo suporte pedagógico e programas de relacionamento com a comunidade escolar, incluindo campanhas institucionais e de marketing. Em seu site institucional, afirma atender a um total de 10 milhões de alunos no Brasil, Japão e Estados Unidos[3].
Outras empresas com rendas líquidas superiores a 100 milhões de reais em 2006, também se destacam capturadas pela lei do máximo valor: Estácio Participações (829 milhões), Sistema Educacional Brasileiro/Pearson Sistemas do Brasil S.A. (120,4 milhões), Anhanguera Educacional (113 milhões)[4]
Ora, se somente consideramos essas empresas de educação, e incluímos entre elas a Abril Educacional que controla as editoras Ática e Scipione, é possível, por um lado, ter uma dimensão da pressão política que podem exercer junto a vereadores, deputados e senadores, MEC e Conselho Nacional de Educação para desregular o campo da educação nacional e abocanhar vultosas somas das verbas públicas. Por outro nos permite associar a elas o empenho do Movimento Todos pela Educação de ser o principal protagonista no debate sobre a educação nacional, na construção de uma agenda, afirmação de um novo pacto social por políticas públicas, definição judicial do que é qualidade da educação etc. A associação de ambos, empresários movidos pela alta rentabilidade e empresários do Movimento Todos pela Educação, cria uma frente privatista que definitivamente entroniza o deus mercado no campo da educação tendo apenas como expectativa os quatro pilares da educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.
Esse deus, porém, é de barro e suas representações estão prestes a ruir definitivamente. A indignação social mundial materializado no movimento dos indignados, que se levanta contra ele e seus acólitos, deveria na sua versão brasileira abrigar a imediata exigência de proteção da educação pública como direito social garantido pelo Estado e efetivo controle de capitais no campo da educação. A grande lição que a crise do capitalismo nos oferece é que as suas estruturas neoliberais foram somente construídas para a rentabilidade máxima. Jamais esteve em seus horizontes produzir um legado educacional sólido capaz de elevar as novas gerações a patamares de uma sociabilidade mais justos, iguais, fraternos e de promoção de nossa própria humanidade.
  





[1] CARVALHO, Márcia Marques de. Projeção da Matrícula no Ensino Superior no Brasil, por Dependência Administrativa:Um Exercício Preliminar. Rio de Janeiro: Observatório Universitário/ Instituto Databrasil – Ensino e Pesquisa, 2004. Disponível no site: http://www.observatoriouniversitario.org.br/pdf_documentos_de_trabalho/documentos_de_trabalho_26.pdf
[2] Dados obtidos no site institucional da Kronton Educacional. Disponível: http://www.kroton.com.br/ Acesso em Outubro de 2011.
[3] Site institucional do Grupo Positivo. http://www.positivo.com.br
[4] Informações obtidas no site institucional da BOVESPA. Disponível: http://www.bmfbovespa.com.br/cias-listadas

8.11.11

COISAS DA EDUCAÇÃO - Educação Pública: O ovo da serpente

COISAS DA EDUCAÇÃO - Educação Pública: O ovo da serpente: As crises do capitalismo são sempre profundamente problemáticas. Além de empobrecer populações e excluir grande parte do acesso aos bens...

O ovo da serpente


As crises do capitalismo são sempre profundamente problemáticas. Além de empobrecer populações e excluir grande parte do acesso aos bens socialmente produzidos, elas geram medos e fortes guinadas à direita, ou melhor, a busca de alternativas e soluções fascistas. Foi assim no período de reconversão da economia de guerra pós-1918. A atual incapacidade dos governos europeus de dar respostas eficientes às demandas da sociedade constitui o ovo da serpente nazifascista. A partir do rompimento da casca de semelhante ovo no período entreguerras é que surgiram Hitler, Mussolini, Salazar e Franco atentos ao que os seus povos queriam ouvir a cerca das questões sociais, econômicas, políticas ou culturais.
A guinada à direita que hoje se assiste na União Europeia, produzida pela crise de realização do capital na zona do euro, acrescida das questões relativas à imigração e pluralismo cultural, é um grande motivo de preocupação tanto para os setores mais progressistas da região, quanto para todo o mundo. Hoje, somente cinco dos 27 países da EU têm primeiros ministros progressistas e a cada dia emergem mais e mais grupos radicais ou alternativos.

6.11.11

Indignados, pães e brioches


A crise estrutural do capitalismo está trazendo à cena novos sujeitos políticos que vêm ocupando as ruas dos países da zona do euro, dos Estados Unidos e do Chile. Todos estão indignados com a sensação de padecer de uma crise que é financeira, econômica e social e que o aspecto social é o menos considerado pelas autoridades governamentais ainda que seja essencialmente a chave para a saída da crise. Ao mesmo tempo esses novos sujeitos expressam seu desdém à política oficial convertida em profissão e exigem mais política, isto é, mais democracia, com a efetiva participação cidadã nos destinos dos seus estados nacionais.
O capital-imperialismo subsumiu os estados nacionais retirando de suas populações o direito de traçar os seus destinos nas suas arenas políticas. As regulações supranacionais consensuadas nas grandes mesas de negociações das conferências intergovernamentais manietaram as políticas nacionais, transformaram os chefes de governo e de estado em simples executivos das determinações do capital para garantir a lei da máxima rentabilidade dos investimentos improdutivos e criaram uma classe política dissociada dos próprios eleitores e interessada apenas nos seus interesses eleitorais e eleitoreiros particulares.
A ortodoxia neoliberal, no entanto, surda e insensível aos clamores que se fazem ouvir a partir das ruas, tem impedido quaisquer considerações profundas sobre a questão social na Europa. Ela insiste em manter na ordem do dia os arrochos salariais, cortes significativos nos programas sociais, demissões em massa, cortes nas aposentadorias, diminuição de férias e aumento das jornadas diárias de trabalho. O corolário imediato das medidas oficiais que estão sendo levadas a efeito é a previsão de prolongada recessão econômica e de muitas dificuldades para os cidadãos comuns da União Europeia e dos Estados Unidos.
A superação da crise, contudo, não é pelos caminhos econômicos. Para uns, ela deverá ocorrer com a inversão das tendências produtoras de desigualdades sociais e com o reforço do Estado do Bem Estar (Welfare State). Outros tendem a acreditar na impossibilidade de restauração do welfare state argumentando que a complexidade adquirida pelo capitalismo financeiro atual situa-o num tempo em que as condições têm outras determinações, completamente diferentes daquelas que permitiram dar materialidade ao Estado de Bem Estar Social no período entre guerras mundiais. De fato, a superação das desigualdades sociais demanda novas ações político-sociais concretas em bases democráticas sólidas e imediatas.
Ao invés de reformas estruturais que alarguem a participação democrática e restabeleçam os programas sociais, a mesma ortodoxia insiste em demonizar os movimentos dos indignados e tentar reprimi-los com os aparelhos policiais de última geração.
Da perspectiva dessa ortodoxia, se o povo não tem pão, que coma brioches. Historicamente, entretanto, essa mesma insensibilidade já nos mostrou as suas consequências.

Divagando

  A rigor a esquerda latino-americana é radicalmente contra o neoliberalismo. A produção acadêmica dos anos 1990 para cá é um belo exemplo d...