8.4.13

Educação Brasileira e bandidagem


(publicado no Jornal Folha Dirigida, Caderno Educação, Coluna Sem Censura, página 04, edição de 11 a 17 de abril de 2013.)


Nesta semana que passou, mais precisamente no dia 04 de abril de 2013, o deputado Robson Leite (PT/RJ) na qualidade de relator da CPI/ALERJ de privatização do Ensino Superior no Estado do Rio de Janeiro leu publicamente o seu voto. A votação do relatório, no entanto, ocorrerá entre os dias 11 e 18 de abril.
Anteriormente já comentei acerca dos cuidados na elaboração do relatório. Foi feita a investigação possível com dados de diversas fontes e se conseguiu identificar 16 grupos nacionais e internacionais de investidores em Educação Superior no Estado do Rio de Janeiro, presencial e a distância, e pasmem, também na Educação Básica.
O que o relatório revela é estarrecedor. Dezesseis grupos destacam-se como os principais investidores que atuam no Brasil. A CPI identificou e caracterizou os seguintes, conforme consta no voto do relator.
1. “Estácio S.A /GP e outros – Dentre outros negócios, controla o comércio varejista de rede (Lojas Americanas), bancos, bebidas (AMBEV-IMBEV). Um dos três fundadores do GP criou a Fundação Lemann para atuação na Educação Básica Pública (parcerias);
2. UNIP – Objetivo/Apollo Group – Este grupo tem se mostrado agressivo no processo de concentração de capital no setor da educação. Forte presença também na Educação Básica Privada diretamente e na Pública, por meio de parcerias para material didático;
3. Kroton – Pitágoras/ Kroton – Pitágoras - Atuação na Educação Básica Pública (parceria). Anteriormente controlada pelo Apollo Group, organização de base estadunidense, com perfil agressivo na aquisição do controle sobre instituições de ensino superior em diversas regiões do mundo. Recentemente, o Apollo saiu e o Grupo Pitágoras recomprou a fatia acionária;
4. Anhembi-Laureate/ Laureate – O Grupo Laureate é um grande grupo de base estadunidense com atuação em IES de diversos países, onde implanta seu modelo, sob consultoria da Sungard Higher Educacion;
5. UNINOVE/UNINOVE- Iniciou aquisição de IES pequenas, simultaneamente ao processo de expansão interna com campi descentralizados;
6. SEB/Pearson (Financial Times) CREDIT SUISSE – Grupo que vem assumindo perfil agressivo na Educação Superior. Destaque para a presença, entre os investidores, do Banco Credit Suisse. Ingressa na Educação Superior com perfil de mercado, capital aberto. O Pearson, recente investidor, controla o jornal britânico Financial Times. O SEB, consolidado na Educação Básica privada e na “indústria” de cursos preparatórios, recentemente assume a entrada na Educação Básica Pública, por meio de parcerias. Marcas: COC, Pueri Domus, Dom Bosco e Name;
7. Anhanguera Educacional/ Banco Pátria – Primeiro a abrir o capital, um dos grupos mais proeminentes no processo de “consolidação”. Um dos grandes grupos adquirentes dos últimos anos. As Instituições de Ensino Superior adquiridas passam a se denominar Centro Universitário Anhanguera ou Faculdade Anhanguera, ou adotam o nome Unianhanguera, dependendo do seu status de credenciamento;
8. UNICSUL-Grupo Cruzeiro do Sul/Grupo Cruzeiro do Sul Educacional – Volume significativo de matrículas locais e movimentos de aquisições;
9. Universo/Universo-Tem se expandido para outros Estados com campi próprios, atingindo um volume de matrículas que o situa entre os maiores. Convênio com sete Universidades estrangeiras;
10. Anima Educação /Anima Educação – Grupo emergente sediado em São Paulo e composto por empresários oriundos de áreas como finanças, direito etc. Pretende adotar o modelo de negócios de tais setores e já atingiu um volume representativo de matrículas;
11. UNIBAN/Academia Paulista Anchieta – Perfil semelhante ao grupo UNINOVE no sentido da expansão;
12. Grupo VERIS IBMEC/Capital Internacional – Os Grupos VERIS e IBMEC se fundem, e, no processo de abertura de capital, além de participação própria, venderam recentemente uma parcela de ações para o grupo de investimento Capital Internacional (Magazine Luisa, McDonald’s e outros diversos países).O Grupo apresenta-se com sedes próprias e a marca IBMEC/VERIS em alguns estados e atuam em parcerias com Institutos locais em outros. Tendência a ampliar o perfil de cursos na área de negócios situados no nicho Premium;
13. Grupo Mauricio de Nassau/Grupo SER / Cartesian Capital Group – Considerado pela Consultoria Hoper Educacional como uma das tendências no mercado consolidador. Seu dirigente é um dos mais atuantes no Fórum da Livre Iniciativa e na ABMES.O Cartesian Capital Group, investidor do grupo, atua também nas áreas farmacêutica, bancos, automóveis, metais etc.;
14. UB Participações – UB Participações Unibrasil / UB Participações– Chama a atenção por ter o capital aberto, embora ainda de abrangência limitada. O número de matrículas, entretanto, e o fato de atuar no Sul e no nordeste, indicam a tendência a sua afirmação no “mercado”;
15. UNIT/Sociedade de Educação Tiradentes LTDA – IES de abrangência regional, mas com volume significativo;
16. Grupo FANOR – DEVRY/ Pactual Capital Partners – O Devry é um grupo estadunidense com tendência de expansão das atividades no Brasil” (Fonte: Voto do Relator da CPI).

De imediato, chama nossa atenção nesse conjunto a diversificação dos investimentos: lojas de varejo (Lojas Americanas), lojas de fast-food (McDonald’s), bancos, bebidas (AMBEV/IMBEV), jornais (Financial Times, The Economist), editoras (Longman, Penguin, Prentice Hall, Addison Wesley), fármacos, automóveis, metais. A educação é apenas mais uma área de investimentos e isto já indica que tais grupos tratam-na com a mesma ética mercadológica. É só mais um negócio de prestação de serviços. Pouco importa que seja regida por princípios de liberdade e ideais de solidariedade humana, que os seus fins sejam “o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (LDB, 1996).

Também nos chama a atenção a expansão de grupos com capital estrangeiro, sobretudo americano, no campo da educação brasileira, de todos os níveis e modalidades: Anhembi-Laureate/Laureate, Fanor – Devry/Pactual Capital Partners e Mauricio de Nassau/Grupo SER/Cartesian Capital Group.
Da mesma forma é de estarrecer a participação de grupos estrangeiros investindo na Educação Básica de nossas crianças e jovens: Estácio S.A/Group, UNIP – Objetivo/ Apollo Group, Kroton – Pitágoras, SEB/Pearson(Financial Times) CREDIT SUISSE. Além de obter o controle de diversas educandários de Educação Básica, a galinha dos ovos de ouro é representada pela venda de tecnologias educacionais (programas informatizados, cd-roms, etc.), cursos, livros etc. Em mais de um Munícipio brasileiro, há grupos que exercem um controle total sobre a Secretaria de Educação.

Esta expansão por si só suscita muitas indagações e preocupações. Qual qualidade de formação oferecem os cursos destes grupos? Que valores éticos, políticos, humanistas etc. veiculam no sentido de realizar um projeto brasileiro de sociabilidade?

Muitas preocupações, além daquelas presentes nas questões acima, decorrem da expansão desregulamentada do capital privado sobre o nosso sistema de educação. Ainda hoje as nossas leis e normas são incipientes e o efeito desta frouxidão favorece diversas práticas ilegais e imorais. Ilegais porque descumprem leis educacionais, trabalhistas, fiscais etc. Artigos da LDB são descumpridos, salários não são pagos com regularidade, direitos trabalhistas são sonegados, assim como impostos e outras obrigações fiscais. Imorais porque para eles, investir em formação de qualidade referenciada socialmente não traz lucros abundantes e imediatos; o recurso é a simples promoção dos seus cursos com recursos de marketing, cuja falsidade os estudantes somente conhecerão futuramente diante da não conquista de vagas em concursos públicos, reprovação nos exames da OAB e preterição dos seus currículos em diversos postos de trabalho formal. Os cursos que oferecem, de fato, são precários como evidencia o relatório da CPI. Regra geral, segundo o mesmo relatório, funcionam com turmas cheias em nome do lucro, professores impedidos de pesquisar, currículos flexibilizados e sem pré-requisitos, disciplinas suprimidas, campus e cursos fechados à revelia dos estudantes e professores, e aumento abusivo de mensalidades.

Não bastasse tudo isto, o voto do Relator encaminha diversas denúncias ao Ministério Público, Comissão de Educação da Câmara Federal e MEC (SESu - Secretaria de Educação Superior e SERES - Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior). São denúncias de crimes que ultrapassam o campo educacional e configuram atos de bandidagem, todos qualificados e com penas previstas nos códigos brasileiros: lavagem de dinheiro, falso testemunho, apropriação indébita de recursos dos docentes, formação de quadrilha, aquisições ilícitas, sonegação fiscal, cerceamento do exercício do direito de livre organização e associação, cessão ilegal de marcas e diplomas para empresas terceirizadas ou familiares, terceirização indiscriminada e ilegal de marcas das IES privadas, assédio moral contra professores.

É grave o que o conteúdo do voto do relator traz ao conhecimento da sociedade. Porém, mais grave ainda será a postergação dos encaminhamentos. O MEC precisa intervir já. A justiça precisa ser feita urgentemente e a bandidagem precisa conhecer as mais novas celas dos presídios de segurança máxima. Este estado de coisas compromete a formação de uma geração e a própria segurança da Nação Brasileira.

Quando a escolha é péssima

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