O orçamento da Educação Brasileira para 2019 prevê a vultosa
quantia de R$ 121.963.197.328,00, o qual, além de congelado por obra e graça do
governo Michel Temer, está sendo reduzido pelo governo Jair Bolsonaro. Com o
corte linear de 30%, todas as instituições de ensino federais têm surrupiado de
seus orçamentos um montante de R$ 4.065.439.910,00. O impacto desse corte é
grande, podendo fechar as portas de muitas delas. Imediatamente significa
paralisar não apenas o ensino, mas sobretudo a pesquisa de ponta de alto valor
agregado num momento em que nomeadamente a União Europeia se organiza para
realizar capital na chamada economia do conhecimento.
Primeiro o corte foi seletivo e puniu três grandes universidades
– Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade de Brasília (UNB) e Universidade
Federal da Bahia (UFBA), sob a irresponsável acusação de terem baixo desempenho
acadêmico, permitirem balbúrdia em seus campi e não aparecerem bem nos
rankings. Essa acusação leviana é incapaz de se sustentar diante dos fatos. O
relatório encomendado pela Capes à Clarivate Analytics (2018)[1],
com dados colhidos na plataforma InCites
e na base de dados multidisciplinar – Web
of Science – a desconstrói num simples piscar de olhos. No ranking de vinte
melhores universidades brasileiras, a UNB, UFF e UFBA têm, respectivamente, as
posições 13ª, 17ª e 19ª. Os critérios da Clarivate Analytics incorporam as
quantidades de papers indexados na Web Science – muitos na lista de papers top
10 -, citações de impacto, colaboração com a indústria e coautoria com
colaboradores estrangeiros. A produção cientifica brasileira é a 13ª em nível
mundial e seus resultados crescem anualmente, afirma o mesmo relatório; esta
produção é superior à de países como Holanda, Rússia, Suíça, Turquia, Twain,
Irã e Suécia.
A razão do corte praticado pelo governo bolsonarista não é
esta, absolutamente. Ela certamente
deriva de sua disposição de combater o que chama “marxismo cultural”, termo
inventado pela extrema-direita e conservadores americanos, na década de 1990,
para justificar ataques a intelectuais e instituições que se opunham às suas
bandeiras supremacistas e cheias de ódio. O estado que o bolsonarismo procura
construir não apenas objetiva liberalizar e privatizar radicalmente a economia;
usar o lawfare para liquidar oponentes e travas à sua governança; restringir os
espaços democráticos e direitos historicamente conquistados. É-lhe importante restaurar os costumes, a
família monogâmica cristã, branca e proprietária tal como imagina ter existido
em um passado mítico e, em especial, liquidar a hegemonia das ideias herdadas
do Iluminismo em todas as áreas do conhecimento e espaços públicos. As
instituições federais de ensino, pesquisa e extensão, das escolas de educação
básica aos cursos universitários de graduação e pós-graduação, aos olhos dos
construtores do estado bolsonarista, soam como aquela pedra no meio do caminho
cantada em verso pelo poeta Carlos Drummond de Andrade:
No
meio do caminho tinha uma pedra
tinha
uma pedra no meio do caminho
tinha
uma pedra
no
meio do caminho tinha uma pedra.
O trabalho de sufocar as instituições federais de ensino,
pesquisa e extensão realizado pelo governo é somente comparável aos crimes de
lesa-pátria praticados pelos mais tenebrosos ditadores, tanto os prejuízos que
impõe à sociedade e à soberania nacional do Brasil. Tamanho reacionarismo interrompe, por exemplo, as pesquisas de biotecnologia, engenharia de alimentos,
nutrição e materiais, fármacos e terapias, micro e nanotecnologia, processos e
compostos químicos, software de modelagem termodinâmica, nanocompósitos,
biovidros etc. etc. O
próprio Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, recém-inaugurado na Unicamp,
maior do que o seu similar existente na Suécia, corre o risco de viver o seu
mais absoluto apagão.
A ser consolidado, o estado
bolsonarista nos imporá a escuridão anti-iluminista. E, como nos recomenda
Jeremias, 13-16, é aconselhável imediatamente todos nós darmos
“glória
ao Senhor vosso Deus, antes que venha a escuridão e antes que tropecem vossos
pés nos montes tenebrosos; antes que, esperando vós luz, ele a mude em sombra
de morte, e a reduza à escuridão”.
[1] CROSS,
Di; THOMSON, Simon; SIBCLAIR, Alexandra. Research in Brazil:
A report for CAPES by Clarivate Analytics. Clarivate
Analytics, 2018. Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/diversos/17012018-CAPES-InCitesReport-Final.pdf>
Acesso em 06 de maio de 2019.